Machado de Assis
Menina e moça
A Ernesto Cibrão
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Está naquela idade inquieta e duvidosa, Que não é dia claro e é já o alvorecer; Entreaberto botão, entrefechada rosa, Um pouco de menina e um pouco de mulher.
Às vezes recatada, outras estouvadinha, Casa no mesmo gesto a loucura e o pudor; Tem cousas de criança e modos de mocinha, Estuda o catecismo e lê versos de amor.
Outras vezes valsando, o seio lhe palpita, De cansaço talvez, talvez de comoção. Quando a boca vermelha os lábios abre e agita, Não sei se pede um beijo ou faz uma oração.
Outras vezes beijando a boneca enfeitada, Olha furtivamente o primo que sorri;
E se corre parece, à brisa enamorada, Abrir as asas de um anjo e tranças de uma huri.
Quando a sala atravessa, é raro que não lance Os olhos para o espelho; e raro que ao deitar Não leia, um quarto de hora, as folhas de um romance Em que a dama conjugue o eterno verbo amar.
Tem na alcova em que dorme, e descansa de dia,
A cama da boneca ao pé do toucador; Quando sonha, repete, em santa companhia, Os livros do colégio e o nome de um doutor.
Alegra-se em ouvindo os compassos da orquestra; E quando entra num baile, é já dama do tom; Compensa-lhe a modista os enfados da mestra; Tem respeito a Geslin, mas adora a Dazon.
Dos cuidados da vida o mais tristonho e acerbo Para ela é o estudo, excetuando-se talvez A lição de sintaxe em que combina o verbo To love, mas sorrindo ao professor de inglês.
Quantas vezes, porém, fitando o olhar no espaço, Parece acompanhar uma etérea visão;
Quantas cruzando ao seio o delicado braço Comprime as pulsações do inquieto coração!
Ah! se nesse ...
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