Alexandre Herculano
MOCIDADE E MORTE
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Solevantado o corpo, os olhos fitos,
As magras mãos cruzadas sobre o peito,
Vede-o, tão moço, velador de angústias,
Pela alta noite em solitário leito.
Por essas faces pálidas, cavadas,
Olhai, em fio as lágrimas deslizam;
E com o pulso, que apressado bate,
Do coração os estos harmonizam.
Ë que nas veias lhe circula a febre:
É que a fronte lhe alaga o suor frio;
É que lá dentro à dor, que o vai roendo,
Responde horrível íntimo cicio.
Encostando na mão o rosto aceso,
Fitou os olhos húmidos de pranto
Na lâmpada mortal ali pendente,
E lá consigo modulou um canto.
É um hino de amor e de esperança?
É oração de angústia e de saudade?
Resignado na dor, saúda a morte,
Ou vibra aos céus blasfémia d'impiedade?
É isso tudo, tumultuando incerto
No delírio febril daquela mente,
Que, balouçada à borda do sepulcro,
Volve após si a vista longamente.
É a poesia a murmurar-lhe na alma
Última nota de quebrada lira;
É o gemido do tombar do cedro;
É triste adeus do trovador que expira.
DESESPERANÇA
Meia-noite bateu, volvendo ao nada
Um dia mais, e caminhando eu sigo!
Vejo-te bem, ó campa misteriosa...
Eu vou, eu vou! Breve serei contigo!
Qual tufão, que ao passar agita o pego,
Meu plácido existir turvou a sorte:
Hálito impuro de pulmões ralados
Me diz que neles se assentou a morte:
Enquanto mil e mil no largo mundo
Dormem em paz sorrindo, eu velo e penso,
E julgo ouvir as preces por finados,
E ver a tumba e o fumegar do incenso.
Se dormito um momento, acordo em sustos;
Pulos me dá o coração no peito,
E abraço e beijo de uma vida extinta
O último sócio, o doloroso leito.
De um ...
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