Alexandre Herculano
A VITÓRIA E A PIEDADE
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I
Eu nunca fiz soar meus pobres cantos
Nos paços dos senhores!
Eu jamais consagrei hino mentido
Da terra dos opressores.
Mal haja o trovador que vai sentar-se
À porta do abastado,
O qual com ouro paga a própria infâmia,
Louvor que foi comprado.
Desonra àquele, que ao poder e ao ouro
Prostitui o alaúde!
Deus à poesia deu por alvo a pátria,
Deu a glória e a virtude.
Feliz ou infeliz, triste ou contente,
Livre o poeta seja,
E em hino isento a inspiração transforme
Que na sua alma adeja.
II
No despontar da vida, do infortúnio
Murchou-me o sopro ardente;
E saudades curti em longes terras
Da minha terra ausente.
O solo do desterro, ai, quanto ingrato
É para o foragido,
E nevoado o céu, árido o prado,
O rio adormecido!
E lá chorei, na idade da esperança,
Da pátria a dura sorte;
Esta alma encaneceu; e antes de tempo
Ergueu hinos à morte;
Que a morte é para o mísero risonha,
Santa da campa a imagem
Ali é que se aferra o porto amigo,
Depois de árdua viagem.
III
Mas quando o pranto me sulcava as faces,
Pranto de atroz saudade,
Deus escutou do vagabundo as preces,
Dele teve piedade.
«Armas», bradaram no desterro os fortes,
Como bradar de um só:
Erguem-se, voam, cingem ferros; cinge-os
Indissolúvel nó.
Com seus irmãos as sacrossantas juras,
Beijando a cruz da espada,
Repetiu o poeta: «Eia, partamos!
Ao mar!» Partia a armada,
Pelas ondas azuis correndo afoutos,
As praias demandámos
Do velho Portugal, e o balção negro
Da guerra despregámos;
De guerra em que era infâmia o ser piedoso,
Nobreza o ser cruel,
E em que o golpe mortal descia envolto
Das maldições no fel.
IV
Fanatismo brutal, ...
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